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Quando Trump espirra, o luxo apanha gripe – ECO

A história tende a repetir-se — primeiro como tragédia, depois como farsa. Em abril de 2025, os mercados financeiros mundiais voltaram a enfrentar um sobressalto com assinatura americana. Ao declarar “emergência nacional” para lidar com o défice comercial dos Estados Unidos, o presidente Donald Trump impôs tarifas agressivas sobre praticamente todas as importações, reacendendo medos de uma nova guerra comercial à escala planetária. As consequências começaram de imediato: bolsas em queda, retaliações da China, e um abalo profundo na confiança económica global.

No dia 2 de abril, Trump invocou a Lei de Poderes Económicos de Emergência Internacional (IEEPA) para impor uma tarifa geral de 10% sobre todas as importações — uma decisão que, segundo o próprio, visa “proteger os interesses americanos contra práticas comerciais desleais” e “recuperar postos de trabalho industriais perdidos”. Contudo, a medida não parou por aí: parceiros como a China viram tarifas específicas elevadas até aos 54%, num gesto que Pequim rapidamente classificou como “hostil e economicamente míope”.

A resposta chinesa foi rápida e contundente: tarifas adicionais de 34% sobre todos os bens americanos. O resultado? Um cenário de tensão bilateral que ressoa pelos corredores de Davos, pelos índices das bolsas e até pelos corredores das grandes casas de luxo.

Os mercados financeiros reagiram em pânico. O índice S&P 500 mergulhou mais de 4% antes de recuperar ligeiramente, encerrando com uma queda de 0,2%. O Dow Jones caiu 0,9%, enquanto na Europa o FTSE 100 em Londres recuou 4,38%, o seu nível mais baixo em mais de um ano de acordo com o Newsportu.

O nervosismo não se limitou ao setor bolsista. Investidores correram para ativos de refúgio, como o ouro e os títulos do Tesouro americano, antecipando uma prolongada incerteza económica. As empresas multinacionais começaram a rever projeções de lucros, a adiar investimentos e a reconfigurar cadeias logísticas.

Para os analistas, o mais preocupante é o efeito dominó. Economias interdependentes podem entrar numa espiral de retaliações comerciais, agravando pressões inflacionistas já latentes. O dólar, ao contrário das expectativas iniciais, desvalorizou-se face a outras moedas fortes — reflexo de uma menor confiança global na estabilidade da política económica americana.

Para o economista Paul Krugman, citado pela Newsportu, “estamos a assistir ao renascimento de um nacionalismo económico desestabilizador, num momento em que o mundo mais precisava de coordenação”. O risco de estagflação — um cenário de inflação alta combinada com crescimento estagnado — já foi mencionado por casas de investimento como a Bernstein.

Moda e luxo: a tempestade perfeita
O mercado de luxo iniciou a semana em forte queda nas bolsas internacionais. Nesta segunda-feira, 7 de abril, as ações de grandes conglomerados como a Kering, a LVMH, a Richemont e a Swatch Group caíram a pique, refletindo o aumento das tensões económicas globais e novas projeções pouco animadoras para o setor.

A Kering liderou as perdas, com um recuo de 10,3%. A Richemont caiu 8,4%, a Swatch Group 6,9%, e a LVMH — maior conglomerado do segmento — perdeu 6,8% em valor de mercado. O índice Shanghai Composite, que reúne todas as ações negociadas na Bolsa de Valores de Xangai, também teve um dia negativo, fechando com uma baixa expressiva de 7,3%, influenciando os mercados europeus e agravando o cenário para os exportadores de luxo.

O banco Bernstein, que há poucos meses previa um crescimento de 5% para o setor de luxo em 2025, reviu agora as estimativas para uma retração de 2%. O novo relatório, analisado pela WWD, aponta diretamente o impacto das tarifas comerciais impostas pelos EUA, a possibilidade de estagflação e a desvalorização do dólar como os principais fatores de risco iminente.

Até ao momento, poucas empresas do setor se pronunciaram publicamente sobre os efeitos das tarifas. Uma das exceções foi a Ferrari, que afirmou já estar a planear imputar o impacto ao consumidor final. Este posicionamento poderá tornar-se tendência, à medida que os primeiros resultados trimestrais de 2025 forem conhecidos — sendo o da LVMH o mais aguardado, com publicação marcada para 15 de abril.

Custo, complexidade e consumo
Na prática, o luxo moderno é um quebra-cabeças logístico. Uma carteira em pele de uma marca francesa pode ser desenhada em Paris, feita com couro italiano, ferragens chinesas e montada na Roménia. Uma única tarifa sobre um dos elos da cadeia pode transformar radicalmente o preço final — e isso antes de se somarem os custos de transporte, seguros e armazenagem.

Muitas destas marcas já começaram a rever os seus mapas de produção. Alguns falam em ‘friendshoring’ — deslocar fábricas para países aliados, longe de zonas de tensão geopolítica. Outros apostam no ‘reshoring’, ou seja, trazer parte da produção de volta à Europa ou aos EUA, mesmo que isso implique menor margem de lucro.

Para o consumidor final, os efeitos ainda estão por se materializar, mas são inevitáveis. Os produtos de luxo poderão subir de preço nos EUA, onde as tarifas incidem sobre bens europeus e asiáticos. Já os consumidores chineses, tradicionalmente ávidos por marcas ocidentais, poderão ressentir-se de retaliações internas ou de uma nova vaga de incentivos ao consumo de marcas nacionais. Além disso, há uma questão de perceção. As marcas de luxo vivem de desejo, de narrativa e de exclusividade. Em tempos de incerteza, esse desejo pode ser comprometido, sobretudo se for associado a instabilidade económica ou a preços inflacionados.

As medidas de Trump são também um sinal de uma tendência mais ampla: a fragmentação da globalização tal como a conhecemos. O regresso do protecionismo, o enfraquecimento da OMC, as tensões EUA-China, e os conflitos regionais têm contribuído para uma redefinição das regras do jogo.

Para o setor de luxo, esta nova realidade exigirá ajustes logísticos e comerciais, bem como narrativas adaptadas a consumidores mais cautelosos, conscientes e, em muitos casos, patrióticos. A indústria da moda e do luxo, embora seja muitas vezes vista como um bastião de estabilidade e crescimento, não está imune. Pelo contrário: é uma das primeiras a sentir o impacto, e talvez uma das últimas a recuperar. A única certeza é a de que o luxo terá de – mais uma vez – reinventar-se. Menos exuberância, mais estratégia. Menos glamour, mais resiliência.



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