A série documental “Furacão Katrina: Corrida Contra o Tempo”, que se estreia a 28 de julho no National Geographic e Disney+, mostra “uma história de justiça ambiental” que continua atual, disse à Lusa a sua realizadora, Traci A. Curry.
A série de cinco episódios documenta a catástrofe que se abateu sobre Nova Orleães, estado do Luisiana, em 29 de agosto de 2005. Quase vinte anos depois, muitas das lições sobre o impacto da mão humana nestes desastres e a resposta subsequente ficaram por aprender.
“É uma história que continua em conversa com o momento em que nos encontramos hoje”, afirmou a cineasta. “Porque têm acontecido eventos ambientais, seja fogos, furacões ou tempestades, em que os contornos são muito similares ao Katrina”.
O mais recente é o das inundações no Texas que causaram 135 mortos, incluindo 27 raparigas que se encontravam no campo de férias Mystic.
“Uma das coisas que isto nos diz é que o Katrina não está apenas no passado”, salientou Curry. “Estes eventos meteorológicos são exacerbados pelo impacto humano no ambiente, e quando encontram infraestrutura que não está preparada para eles, o resultado afeta sobretudo as pessoas mais vulneráveis”.
É o que vemos na série, que segue o desastre de forma cronológica com recurso a imagens de arquivo, vídeos caseiros dos residentes e testemunhos de autoridades e sobreviventes.
Um dos pontos essenciais mostrados por Traci Curry é que o impacto mais mortífero do desastre não foi trazido pelo furacão, mas sim pelo rebentamento dos diques que tinham deficiências estruturais e provocaram inundações maciças. No pico, 80% da cidade estava debaixo de água.
“O que também ficou evidente é que sempre houve barreiras naturais, como os pântanos na zona costeira da Luisiana, que atenuavam a força dos furacões”, explicou a realizadora. Numa sequência que foi cortada da versão final, falava das antigas “festas do furacão”, celebradas outrora, porque as tempestades nunca eram tão sérias como temido.
Mas as terras pantanosas e as barreiras naturais foram desaparecendo, os diques foram mal construídos, e o furacão de categoria 5 atingiu zonas em que muitos dos residentes tinham poucos meios de evacuação. Comunidades afro-americanas com várias gerações desapareceram para sempre.
“O que o Katrina nos ensina é que não temos de escolher entre compaixão pelas vítimas e a responsabilização dos culpados”, considerou a realizadora. “Temos de fazer as duas coisas ao mesmo tempo, porque os sistemas que deviam proteger as pessoas não estão a funcionar”.
Cerca de um milhão de residentes foram deslocados na sequência do furacão, que causou mais de 1.500 mortos, mas a agência federal responsável pela ajuda de emergência, FEMA, falhou de forma contundente. O então presidente republicano George W. Bush estava de férias e demorou dias a visitar os locais afetados.
Milhares de pessoas que procuraram refúgio no Centro de Convenções de Nova Orleães – cerca de 20.000 – estiveram vários dias sem água, comida ou medicamentos. Os que tentaram caminhar pela autoestrada para procurar ajuda na cidade mais próxima foram impedidos de continuar pela Guarda Nacional e por milícias vigilantes, que inclusive mataram a tiro vítimas do furacão para as impedir de entrar.
“Temos de perceber que a responsabilização também inclui reparações para as pessoas que sofreram os maiores malefícios em resultados destas falhas”, disse Curry. “É uma lição que devíamos ter aprendido há vinte anos, mas continua a ser aplicável hoje”.
Uma das coisas que chocou a cineasta foi perceber que, nalgumas zonas da cidade, nada foi recuperado. “No Lower 9th Ward, parece que o Katrina aconteceu no ano passado”, afirmou. “Há quarteirão atrás de quarteirão em que vemos escadas de cimento que sobem para casas que não existem”.
Muitos dos deslocados nunca regressaram. Os que o fizeram continuam a falar hoje de uma Nova Orleães antes do Katrina e depois do Katrina.
Traci Curry espera que esta série reavive o interesse e sirva como alarme para que desastres como este não voltem a acontecer. “É literalmente uma questão de vida e morte”, disse. “É uma questão muito urgente a que temos de responder”.
“Furacão Katrina: Corrida Contra o Tempo” tem produção da Lightbox e da Proximity Media de Ryan Coogler.
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