“Podem destruir uma aldeia, mas não conseguem destruir um símbolo”, disse em entrevista à Lusa o autor do documentário, que se integrou na 3ª Brigada de Assalto ucraniana para testemunhar e filmar a batalha pela libertação de Andriivka.
Situada no oblast (região administrativa) de Donetsk, a aldeia capturada pelas forças russas em 2022 tem um único caminho de acesso, uma floresta de dois quilómetros de comprimento que se tornou um campo de batalha altamente minado. Durante a contraofensiva ucraniana de 2023, a luta por Andriivka tornou-se um espelho do conflito.
“São apenas dois quilómetros. Mas nessa floresta está contida toda a guerra”, afirmou Mstyslav Chernov, que esteve em Los Angeles para a estreia do documentário nos cinemas. “Ao ver a batalha por essa floresta, podemos ver a batalha por toda a linha da frente”.
Chernov espera que o documentário capte a atenção das audiências internacionais numa altura em que o conflito tem perdido cobertura mediática, apesar das tentativas de negociação.
O cineasta salientou que os ucranianos querem paz e isso tornou-se muito mais evidente nos últimos seis meses. “É uma prioridade”, afiançou. “Ao mesmo tempo, se um vizinho continua a atacar as cidades e a avançar no campo de batalha, ocupando mais território, é claro que vamos querer ripostar”.
O documentário mostra uma luta cerrada por cada metro avançado. Recorrendo às câmaras que Chernov e o colega Alex Babenko carregaram, imagens dos capacetes dos soldados e imagens aéreas captadas por ‘drones’, a audiência é confrontada com o horror da guerra. É um ponto de vista na primeira pessoa, imersivo e diferente do que foi visto até agora.
“Podemos ler, podemos assistir de fora, mas estar lá, sentir o medo, ouvir os ‘drones’ por cima da cabeça e caminhar com os soldados em direção ao objetivo era algo que antes não estava disponível”, explicou Chernov. Isso passou a ser possível com mais tecnologia, “permitindo ver o campo de batalha e vivenciar o que os soldados vivem como nunca antes”.
Apesar de toda a tecnologia, o que as imagens também mostram é a natureza primitiva do conflito: soldados que se arrastam para dentro de trincheiras, com pernas e braços rebentados por minas, torniquetes improvisados e mortes violentas no rescaldo de um morteiro ou emboscada.
“O medo primitivo e a raiva que se sente na batalha ainda está lá e não mudou em 100, 200 ou mil anos”, apontou Chernov. “Mas com tecnologia, por vezes parece que estamos a ver um filme de ficção científica”, continuou. “Estas visões e perspetivas contrastantes dão-nos algo único, que não só alarga o género documental mas, mais importante, permite-nos finalmente sentir o que estes homens sentem”.
Mstyslav Chernov, que venceu um Prémio Pulitzer pelo seu trabalho na Associated Press e um Óscar pelo documentário “20 Dias em Mariupol”, falou do seu envolvimento pessoal na batalha por Andriivka. A aldeia fica a menos de duas horas da sua terra natal, Kharkiv, que continua a ser bombardeada.
“São lugares da minha infância onde eu ia ver a minha avó e brincar na floresta com amigos”, contou. “É como se estes homens estivessem a lutar pela minha infância, pelas minhas memórias e vida”.
Abandonada e destruída, a aldeia de Andriivka e a floresta que leva até ela causou mortos de ambos os lados. Mas a sua importância, disse Chernov, foi mais que estratégica. “Lembro-me de falar com os soldados e eles dizerem que esta floresta era tão importante quanto cada rua de Kiev, porque tudo isto é a nossa terra”, afirmou.
“Eles estavam a perder vidas, a perder amigos por isto. Dizerem aquilo significa que o estavam a fazer por um símbolo de esperança”, acrescentou. Queriam voltar a desfraldar a bandeira da Ucrânia em Andriivka e captar o momento em imagens que serviriam para galvanizar os ucranianos.
“Os soldados percebem o que é a guerra moderna, que não é só no campo de batalha, é também nos media”, continuou. “Se hastearem a bandeira mas ninguém assistir a isso, qual o sentido? O objetivo é um símbolo de esperança”.
“2.000 Metros para Andriivka” é uma coprodução Frontline (da PBS) e Associated Press. Teve uma exibição inicial no festival Sundance e estreou-se agora nos cinemas nos Estados Unidos, Reino Unido e Irlanda. A distribuição internacional está a cargo da Dogwoof.
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