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Extrema-direita desconfortável com discurso da Igreja contra capitalismo

Católicos de esquerda e analistas criticam a posição dos movimentos de extrema-direita contra o discurso da Igreja de condenação do capitalismo selvagem ou a defesa dos imigrantes ou da ecologia.

“Perturbam-me bastante esses discursos, perturba-me não por uma tensão normal entre esquerda e direita, mas porque contraria os ensinamentos de Jesus Cristo, que tinha um discurso de conciliação e de consensos, que não são unanimidades”, disse à Lusa Inês Espada Vieira, presidente do Centro de Reflexão Cristã (CRC).

“É muito fácil dizer que somos todos católicos, certo? Mas depois, o desafio que existe é o que dizer ou fazer diante da fragilidade das pessoas”, disse a dirigente católica.

Para Inês Espada Vieira, os discursos populistas, sobretudo da extrema-direita, “são ódio, confrontação, castigo, punição ou vingança pela culpa do outro”, contra “todos os frágeis, sejam imigrantes, sejam mais velhos, sejam pessoas que têm outras maneiras de viver o quotidiano”.

“[Há um discurso de que] temos de desconfiar desses malandros e isso deixa-me, como cidadã e como católica, profundamente triste e às vezes indisposta para não dizer outra coisa”, acrescentou a docente da Universidade Católica.

“Sou católica e de esquerda, o que é visto como um bicho raro, mas, para mim, isso é normal”, disse Espada Vieira, recordando que a defesa dos pobres e a luta do Vaticano “contra as injustiças e a procura de repartir a riqueza do planeta” representam uma posição que identifica como humanismo de esquerda.

Os “católicos, de esquerda ou de direita, devem encontrar o seu espaço no espaço público”, mas no respeito do discurso social da Igreja, defendeu a presidente do CRC, considerando que, apesar do que alguma extrema-direita sustenta, “ser católico não é propriedade de uma ideologia”.

Para Francisco Batista, investigador do Instituto Português de Relações Internacional, os “partidos populistas de direita radical procuram elementos que estão muito identificados com a identidade nacional” para obter apoio, como é o caso da religião em Portugal.

Para o doutorando, com uma tese sobre o papel das guerras culturais na construção da aliança entre os movimentos cristãos conservadores e o Chega, este tipo de narrativas identitárias são transversais a vários países.

No caso português, Francisco Batista dá o exemplo do Movimento Social Cristão, um grupo conservador com católicos e protestantes, onde “quase sempre existem deputados do Chega nos eventos e aparecem a discursar”, apelando “aos valores tradicionais” católicos, mas com críticas ao Vaticano, por ser demasiado liberal.

Um traço em comum entre vários países é o discurso contra as elites, como se esses partidos representassem a vontade genuína da população: “Em Portugal é o discurso contra o sistema, nos EUA é o ‘deep state”.

E muitos “pensam que houve uma infiltração no Vaticano” por valores do “marxismo cultural”, um termo que em Portugal “se associa mais ao ‘wokismo'”, dando o exemplo de qualquer discurso mais crítico do sistema capitalista neoliberal por parte da hierarquia católica.

“Este tipo de partidos utiliza o descontentamento da população e transforma-o num bloco ideológico”, pelo que a “sua luta contra a Igreja deve-se muito à sua ideia de que a Igreja deixou de promover os seus valores mais tradicionais”, preferindo “abraçar causas” que conflituam com aquilo que deveria ser o seu papel, explicou Francisco Batista.

Se à direita o extremismo conflitua com o catolicismo, à esquerda, os católicos sentem-se, muitas vezes, mais isolados, admitiu Inês Espada Vieira.

“Num mundo secular, ser católico neste momento não é sempre fácil, sobretudo católicos que se alinham ideologicamente na esquerda política” até porque são vistos “com alguma desconfiança”, pelos “católicos da tradição conservadora”.

Contudo, mais do que falar para a esquerda ou para a direita, a presidente do CRC defende que a Igreja deve defender os seus valores, mesmo que isso lhe traga custos entre os que se dizem fiéis.

“Não podemos ter medo dos templos vazios. Nós sabemos que o cristianismo na Europa está a diminuir e é óbvio que preferíamos ter igrejas cheias, mas temos de largar essa pressão” e “insistir numa estratégia de testemunho” e de exemplo prático.

“Já não estamos no tempo do proselitismo e da evangelização”, mas da “defesa dos nossos valores”, acrescentou, confiando que o Papa siga esse caminho.

Olhando para Leão XIV, que segue na quinta-feira para a Turquia para a sua primeira viagem papal, Inês Espada Vieira acredita que existirá uma “linha de continuidade” em relação a Francisco e aos antecessores.

“A Igreja é bem mais do que um homem só”, na pessoa do Papa, disse, recordando que Francisco era “um homem carismático, um líder inspirador ou profético”, mas também não convenceu de início, pelo que Leão XIV “fará o seu caminho”.

“A Igreja é o Papa e é muito mais, é uma comunidade feita de homens e de mulheres, com várias expressões, e o que distingue o pensamento social cristão é a ação, o que se faz”, acrescentou.

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