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COP30: quem ganha com o palco da diplomacia climática? – Opinião

Dois moradores de uma grande cidade brasileira conversam sobre a grande novidade na cidade: Belém acolherá, entre 10 e 21 de novembro deste ano, um dos maiores eventos diplomáticos do mundo, a 30.ª Conferência das Partes da ONU sobre Alterações Climáticas — a COP30. Ana, comerciante de sapatos, celebra a notícia com entusiasmo. Com milhares de pessoas a chegar de diferentes países, vê ali uma oportunidade de negócio, movimento e consumo. Gael, professor e pai de uma bebé, mostra-se mais reticente. Pergunta-se se tantas obras, visitantes e estruturas temporárias trarão, de facto, melhorias duradouras para os habitantes da cidade — ou apenas mais trânsito, desigualdade e promessas por cumprir.

A expectativa gerada pela COP30 é compreensível. O Brasil quer reposicionar-se como protagonista da diplomacia climática internacional e apresentar a Amazónia como símbolo global da luta pela sustentabilidade. Contudo, por trás dos holofotes, o que significa para um país — e para uma cidade — acolher um evento desta escala?

A experiência recente das últimas conferências levanta sinais de alerta. A COP24, na Polónia, decorreu num dos países mais dependentes do carvão na Europa, onde a conferência foi patrocinada por empresas do setor mineiro. A COP25, prevista para Santiago do Chile, foi transferida à última hora para Madrid devido à instabilidade social chilena. Apesar disso, o Chile manteve a presidência, o que gerou críticas à sua autoridade moral num contexto de protestos motivados, entre outras coisas, por injustiças ambientais. A conferência acabou marcada pela frustração generalizada e por avanços mínimos em temas cruciais como mercados de carbono.

A COP26, em Glasgow, foi apresentada como um ponto de viragem, mas esbarrou em contradições internas do Reino Unido, que promoveu o evento enquanto aprovava novos projetos de petróleo no mar do Norte. Além disso, foi amplamente criticada pela exclusão de representantes de países em desenvolvimento, dificultada por desigualdades no acesso à vacinação e restrições de viagem relacionadas com a pandemia.

A COP27, no Egipto, decorreu sob forte vigilância e com repressão à sociedade civil, contrastando com o discurso de justiça climática. A COP28, nos Emirados Árabes Unidos, foi presidida pelo CEO da petrolífera estatal ADNOC — um paradoxo que suscitou acusações de conflito de interesses. Já a COP29, no Azerbaijão, repetiu o padrão: um petroestado a liderar negociações sobre a eliminação de combustíveis fósseis, sem assumir compromissos concretos.

Agora, com a COP30, o Brasil está no centro desta tensão entre a imagem e a realidade. O país fala de transição ecológica, mas, segundo um artigo recente na revista Science, há sinais claros de que o agronegócio e a pressão sobre as terras indígenas podem comprometer o verdadeiro alcance da conferência. A Amazónia, ao mesmo tempo, bandeira e fronteira de expansão económica, continua a ser palco de desflorestação, violência contra povos originários e fragilidade na fiscalização ambiental.

O controverso caso da nova autoestrada construída no meio da floresta amazónica para facilitar o acesso à COP30 é um exemplo das contradições. A obra foi anunciada como uma melhoria logística, mas envolve o abate de milhares de árvores e o atravessamento de territórios sensíveis. Para Gael, que vive na periferia de Belém, a ironia é amarga: muitos carros e camiões passarão pela rodovia, mas ele não conseguirá sequer atravessar a nova via com segurança para levar a filha a um hospital no centro da cidade.

Sediar uma COP traz visibilidade, sim, mas também responsabilidades. É uma oportunidade para catalisar políticas públicas, acelerar investimentos sustentáveis e melhorar infraestruturas urbanas. Contudo, sem coerência entre discurso e prática, o risco é que tudo se limite a um grande palco para “greenwashingdiplomático — com efeitos marginais na vida das pessoas que mais precisariam de transformação.

Belém pode ganhar com a COP30. Ana poderá, de facto, vender mais sapatos. Por outro lado, para Gael (e o futuro da sua filha), para os demais moradores e para Ana, os benefícios reais dependerão de algo mais profundo: a capacidade de o Brasil alinhar a retórica internacional com compromissos ambientais sérios, duradouros e justos. Só assim a COP30 deixará de ser apenas um evento e passará a ser um marco, com um legado importante.



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