Já são conhecidos os dez vencedores da 10ª edição do Programa Gilead Génese, que esta terça-feira atribuiu bolsas de financiamento em duas categorias: investigação e comunidade. No total, são perto de €300 mil para aprofundar conhecimento em áreas como o VIH, as hepatites virais ou o cancro da mama, no caso da investigação, mas também para melhorar o acesso a cuidados de saúde. “Mais do que celebrar os projetos vencedores, hoje celebramos um compromisso com a ciência, com a inovação e, acima de tudo, com os doentes”, afirmou a secretária de Estado da Saúde.
Ana Povo, que participou na cerimónia que decorreu no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, fez questão de sublinhar “a esperança que estes projetos trazem para os doentes, a inspiração que geram entre os profissionais de saúde e o impacto positivo que têm na sociedade portuguesa”. A responsável política – também ela com um passado ligado à investigação – defendeu ainda que, além dos resultados em saúde, a investigação “gera valor económico e social” que não deve ser menosprezado. “Este Governo está empenhado em melhorar e dignificar o panorama dos ensaios clínicos em Portugal”, acrescentou.
Através de uma mensagem gravada, o presidente da República destacou a relevância das atividades de investigação para o país. “É muito, muito importante a investigação pura, mas a investigação aplicada, a investigação clínica com resultados ainda mais palpáveis e visíveis. Ela própria é muito estimulante e há que investir muitíssimo nela”, apelou.
Esta cerimónia, que contou com o Expresso como media partner, assinalou ainda a 10ª edição do programa que desde 2013 apoia projetos de investigação e de intervenção comunitária. “Ao olharmos para os números das dez edições, tomamos ainda mais consciência da sua pegada”, assinalou María Río, vice-presidente e diretora-geral da Gilead Espanha e Portugal. A responsável referia-se às cerca de 500 candidaturas recebidas ao longo dos anos, aos 124 projetos distinguidos com bolsas de financiamento e os quase €3 milhões investidos. “Mas estes avanços [científicos] só são possíveis porque não estamos sozinhos. O inestimável contributo de investigadores, de entidades reguladoras, de profissionais de saúde e das ONG é determinante para que a inovação possa chegar a quem realmente precisa”, afirmou.
A líder da farmacêutica confirmou ainda a intenção de passar “uma parte importante da nossa capacidade de produção” para Portugal “através de acordos estratégicos com parceiros nacionais”.
O evento contou ainda com um painel de debate em que participaram Carlos Martins (ULS Santa Maria), José Dinis (IPO Porto) e Tomás Lamas (Associação Batzu), bem como a intervenção de Jorge Soares, membro da Comissão Consultiva do Programa Gilead Génese. Consulte abaixo as principais conclusões do evento e a lista completa de vencedores.
Autonomia é palavra-chave na investigação
- “O financiamento é crítico para a atividade dos investigadores”, reconhece Jorge Soares, que lamenta que Portugal não esteja no grupo de países que mais investe em ciência. “É no grupo dos países que consideramos mais desenvolvidos que vamos encontrar mais investimento nesta área”, apontou.
- É preciso, por isso, aumentar “o investimento público”, que está “bem aquém” do desejável, mas também facilitar o mecenato científico para que o potencial científico do país possa ser explorado.
- Mas é mesmo a autonomia que era, até há pouco tempo, o maior obstáculo para as instituições públicas de investigação e que foi ultrapassado com a publicação, em fevereiro do ano passado, do despacho que permite a formação de fundações de direito privado associadas aos hospitais públicos.
- “Esta é a hora da mudança”, sublinhou José Dinis, coordenador do Plano Nacional de Combate ao Cancro. No IPO do Porto, onde trabalha, será assinado em breve o contrato que permitirá a criação de uma fundação para a gestão dos recursos dedicados à investigação. “Só ainda não foi assinado por falta de agenda do primeiro-ministro”, assegura.
- Carlos Martins, responsável pela gestão da ULS Santa Maria, congratula-se por ter conseguido fazer avançar no mesmo sentido e estar a investir não apenas num centro de investigação clínica, como também numa reorganização estrutural e na construção de um novo espaço dedicado à investigação. “Permitirá ter autonomia, competitividade e atrair os melhores. Para vincularmos os melhores, temos de lhes dar condições”, insistiu.
- Tomás Lamas, em representação dos doentes, considera ser preciso simplificar o acesso à participação em ensaios clínicos que possam beneficiar quem mais precisa. “A grande dificuldade é perceber aquela informação, a validade e como chegar lá. Os nossos médicos não têm tempo para procurar ensaios clínicos para o seu doente e isto cria, logo à partida, uma barreira de acesso”, explicou.
- Em parte, a solução passa por tornar as instituições de investigação autónomas da gestão pública, torná-las mais competitivas a nível internacional e conseguir atrair, dessa forma, mais ensaios clínicos para Portugal.
EVITA Platform: Prevenção através de Videoconsultas de Medicina Genética para Mulheres Jovens Adultas em Risco de Cancro da Mama Hereditário
O projeto EVITA Platform dedica-se a capacitar mulheres jovens adultas, especialmente entre os 25 e os 39 anos, que enfrentam desafios no diagnóstico e tratamento do cancro da mama hereditário, frequentemente marcados por atrasos e pela desvalorização das suas preocupações devido à sua idade jovem. A plataforma disponibiliza uma ferramenta digital inovadora que permite avaliar o risco individual de cancro hereditário através de um questionário sobre a história pessoal e familiar das utilizadoras. Serão disponibilizadas vídeo-consultas de aconselhamento genético a mulheres que, perante a avaliação de risco efetuada, apresentem risco elevado para cancro hereditário, promovendo assim diagnósticos precoces e intervenções preventivas. Para além de salvar vidas, o projeto visa demonstrar o potencial da digitalização no Sistema Nacional de Saúde, otimizando os cuidados oncológicos ao reduzir tratamentos invasivos e promovendo um acompanhamento mais acessível e personalizado.
Mosaico – microeliminação de Hepatites Virais e prevenção VIH/SIDA
Este é um projeto que nasce em Vila Nova de Gaia, num território multicultural, e visa, de forma descentralizada, a microeliminação das hepatites virais, a prevenção e tratamento VIH em populações vulneráveis e de difícil acesso: refugiados, migrantes, sem-abrigo, pessoas que vivem com VIH e que apresentam maior dificuldade em aceder aos cuidados de saúde primários. Mosaico garante que, perante um rastreio reativo, a pessoa inicia tratamento o mais rapidamente possível. Pretende-se ainda promover a literacia em saúde, a distribuição de materiais preventivos e informativos sobre infeções sexualmente transmissíveis (sífilis, gonorreia, clamídea) e a referenciação.
Pares a Passo
O objetivo do Pares a Passo é criar um serviço individualizado que facilite o acesso aos cuidados de saúde, ao tratamento e a uma melhor adesão e retenção aos cuidados. Este projeto visa ainda promover a literacia, o apoio psicológico, social, psicossocial e continuação no tratamento médico, promovendo uma melhor qualidade de vida e facilitando a comunicação com os profissionais de saúde. Este acompanhamento desenvolvido por pares facilita o elo entre o utente e o meio hospitalar.
Mulheres com Voz
O projeto visa capacitar um grupo de 10 mulheres africanas que vivem com VIH, de modo a serem agentes de mudança na sua comunidade. Munindo estas mulheres de conhecimentos abrangentes nas áreas do VIH e hepatites virais, pretende-se que se assumam como grupo de pares, constituam um fórum de discussão e organizem duas atividades de informação e prevenção junto da sua comunidade. No final do projeto, é desejável que este grupo esteja capacitado para intervir junto das suas famílias e restante comunidade, bem como, para eventual integração em organizações de base comunitária, de apoio a pessoas que vivem com VIH, para trabalho de pares, em regime de voluntariado ou profissional.
PAR a PAR
A insuficiência de respostas de apoio à ligação aos cuidados de saúde adaptadas a grupos mais vulneráveis à infeção por VIH e outras Infeções Sexualmente Transmissíveis, dificulta o acesso a respostas formais do SNS, que sendo direcionadas à população em geral, não contemplam uma intervenção de proximidade e facilitadora de uma boa adesão e retenção ao tratamento. Com uma abordagem participativa de base comunitária, o projeto PAR a PAR visa promover a ligação, adesão e retenção ao tratamento de VIH, através de um serviço de acompanhamento individualizado, com base num modelo de navegação hospitalar por pares e profissionais da área social.
FibHep: um modelo 3D in vitro de fibrose humana em hepatite
As hepatites virais, nomeadamente as hepatites B e C, são as principais causas de doença hepática crónica, que culmina em fibrose e cirrose. Não estão ainda disponíveis terapias eficazes para a fibrose hepática, em parte devido à ausência de modelos fiéis da doença, onde possam ser testados novos fármacos. O objetivo do projeto é criar um modelo in vitro da fibrose hepática humana, utilizando biomateriais e células hepáticas humanas, que permitirá a avaliação de novos fármacos num contexto que se assemelha mais à clínica, comparando com os modelos animais atualmente em uso. Este modelo será validado através do teste do potencial antifibrótico de uma nova terapia baseada em nanopartículas.
INVEST: ExplorINg VGF receptor as a ThErapeutic target for Breast Cancer Brain MetaSTases
O projeto do grupo Cancer Metastasis, do i3S, surge para enfrentar um dos maiores desafios no tratamento do cancro da mama: as metástases cerebrais. Esta complicação grave e devastadora impacta fortemente a qualidade de vida das doentes e das suas famílias. Apesar dos avanços científicos, as opções terapêuticas para combater estas metástases são ainda limitadas, destacando a necessidade urgente de desenvolver novas abordagens eficazes. O projeto INVEST, surge precisamente para enfrentar este desafio, apostando em soluções inovadoras para compreender e combater a disseminação do cancro da mama para o cérebro.
Identificação de Neutrófilos Específicos para Melhorar a Eficácia da Imunoterapia no Cancro da Mama Triplo Negativo
O cancro de mama triplo negativo é o mais agressivo e difícil de tratar. A imunoterapia é promissora para estes casos, mas ainda não totalmente eficaz. Os neutrófilos são células imunes que à partida defendem o nosso organismo, mas alguns subtipos contribuem para a progressão tumoral e resistência aos tratamentos, como a imunoterapia. Este projeto propõe identificar os subtipos de neutrófilos clinicamente relevantes, que podem servir como marcadores preditivos da resposta à imunoterapia e ajudar a desenvolver melhores estratégias terapêuticas para combater esta doença.
The role of metabolism in UBE2C-driven brain metastatic disease in patients with breast cancer
A disseminação do cancro para o cérebro é uma das principais causas de morte em doentes com cancro da mama, principalmente porque o tratamento das metástases cerebrais tem uma eficácia limitada. Por isso, é importante compreender os mecanismos envolvidos na disseminação cerebral com o objetivo de identificar novos alvos terapêuticos. O grupo de investigação do Instituto Gulbenkian de Medicina Molecular identificou uma proteína que promove a disseminação das células cancerígenas no cérebro. Neste trabalho, será explorada a hipótese de que esta proteína altera o metabolismo das células cancerígenas, tornando-as melhor adaptadas ao cérebro. Para responder a esta questão, os objetivos principais deste projeto de investigação são identificar o perfil metabólico celular de metástases cerebrais de doentes com cancro da mama, avaliar de que forma esta proteína interage com estas vias metabólicas e, finalmente, usar os alvos descobertos para testar novas terapêuticas que possam vir a ser usadas no tratamento das metástases cerebrais de doentes com cancro da mama.
Innovative RANK Signaling Inhibition in Breast Cancer Using Folate-Targeted Lipid Nanoparticles
A via de sinalização do recetor RANK representa um alvo terapêutico promissor no tratamento do cancro da mama. Contudo, as abordagens atuais, direcionadas para o RANK ligando, têm demonstrado eficácia limitada. Embora eficazes no controlo de patologias relacionadas com a reabsorção óssea, essas estratégias não conseguem prevenir a ativação independente do ligando, que ocorre nas células tumorais e contribui para a progressão da doença. Para superar essas limitações, este projeto pretende desenvolver um nanossistema inovador capaz de regular negativamente o RANK ou os seus efetores a jusante, especificamente em células tumorais. Esta abordagem permitirá interromper de forma eficaz a atividade desta via, reduzindo a agressividade tumoral, superando a resistência terapêutica e limitando a evasão imunitária em diferentes subtipos de cancro da mama.
Este projeto é apoiado por patrocinadores, sendo todo o conteúdo criado, editado e produzido pelo Expresso (ver Código de Conduta), sem interferência externa.
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