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Escolher ou decidir? | Opinião

As palavras escolher e decidir, embora muitas vezes sejam usadas como sinónimos, correspondem a duas lógicas diferentes. Da tomada de consciência dessa distinção depende, em grande medida, a capacidade de tomar decisões com real impacto nas nossas vidas, fazendo uso da liberdade própria da condição humana.

A filosofia pode ajudar na distinção entre estes dois conceitos, tornando-nos mais lúcidos quanto à necessidade de tomar decisões quando, mais cedo ou mais tarde, somos confrontados com esse desafio, que pode constituir um ponto de viragem nos nossos percursos.

O filósofo Charles Pépin, no livro La Confiance en Soi, dedica um capítulo ao conceito de decisão, relacionando-o com a capacidade de exercer esta prerrogativa, mobilizando a imprescindível dose de confiança que tal implica, apesar da dúvida que sempre subsiste no que respeita às verdadeiras decisões.

Contudo, é precisamente essa coragem de avançar enfrentando a dúvida que distingue as decisões das escolhas, por natureza bem menos arriscadas. Para tornar estes conceitos mais claros, este filósofo recorre a exemplos da vida prática que poderiam colocar-se a qualquer um de nós.

Quando queremos escolher entre dois destinos de férias, se um destes apresenta objetivamente mais vantagens e está em linha com o valor que pretendemos gastar, a nossa opção recai sobre o mesmo. Neste caso, a escolha obedece a uma opção racional, realizada após uma análise lógica que tem como objetivo reduzir a incerteza.

Já se formos confrontados com uma proposta de mudança de emprego que, embora muito aliciante, implique lidar com a incerteza, sem que possamos dominar à partida todas as variáveis envolvidas, encontramo-nos perante a necessidade de tomar uma decisão.

Assim, de acordo com as definições deste filósofo, escolher é basear-se em critérios racionais para fazer uma opção, enquanto decidir é compensar a insuficiência de critérios objetivos fazendo uso da liberdade. Ou seja, escolher é saber antes de agir; já decidir é agir antes de saber.

Na realidade, é precisamente quando não podemos estar seguros de que a nossa escolha será a melhor que nos encontramos diante da necessidade de tomar uma decisão. Como consequência, fazemos maior uso da nossa liberdade quando decidimos do que quando escolhemos. É na medida em que não sabemos que temos de decidir.

É por esse motivo que é difícil decidir: é bem mais fácil escolher. Perante essa dificuldade, muitas vezes hesitamos porque queremos escolher, quando a vida nos confronta com a necessidade de decidir. Essa liberdade frequentemente perturba-nos, levando-nos a querer esquivar-nos à possibilidade de exercermos o nosso livre arbítrio.

No entanto, ao contrário do que poderíamos pensar, não decidir também constitui uma forma de decisão — e, por sinal, a mais pobre e a menos valorizante que existe. Se não usarmos o nosso poder de decisão, a própria vida se encarregará de tomar decisões por nós.

A dificuldade em decidir reside, antes de tudo o mais, na necessidade de enfrentar a incerteza, encontrando a força para avançar perante a incerteza, apesar da incerteza. Porque todas as decisões são, por natureza, arriscadas. Na verdade, podemos enganar-nos. Na verdade, as consequências podem ser penosas. Porque, não é menos verdade, o risco faz parte intrínseca da tomada de decisão.

Segundo Charles Pépin, quanto mais disponíveis estivermos para aceitar essa quota-parte de risco, mais seremos capazes de tomar decisões e de, apesar de ser difícil, apreciarmos fazê-lo. E, se não está ao nosso alcance delimitar a incerteza, resta-nos a possibilidade de alterar a maneira como a acolhemos. Podemos sempre mudar de perspetiva, ousando olhar para a incerteza de frente.

Esta mudança de perspetiva corresponde à primeira etapa de uma metamorfose interior assente na aceitação da incerteza. A sabedoria decorrente desta metamorfose leva-nos a perceber que a vida não é uma ciência exata e a orgulhar-nos da ousadia de tomarmos uma decisão.

Quanto mais admitirmos a possibilidade de errar, mais nos encararemos como sujeitos livres, capazes de ousar. Ter confiança em si próprio é aprender a amar a liberdade, em vez de a temer. Existe uma alegria especial em sentir-se capaz de tomar uma decisão. E, de cada vez que o fazemos em consciência, aumentamos a nossa confiança para decidir.

No entanto, como salienta a filósofa Marie Robert na obra Le Miracle Du Réconfort, existe um ângulo cheio de lacunas na abordagem da audácia, de acordo com o qual esta costuma ser conotada com a euforia do instante, apreendida no imediato, em toda a sua intensidade.

Devido ao impacto que representa nas nossas vidas, a tomada de uma decisão consistente não corresponde a um ato de impulsividade, mas sim ao culminar de um processo durante o qual pensámos longamente. Porque, uma vez a decisão consumada, ficamos a braços com o desconhecido, necessitando de mobilizar intensos recursos para suportar a mudança.

Para sustentar essa mudança, precisamos de convocar outra forma de ousadia, provavelmente mais sombria e árida, mas não menos importante. Trata-se, segundo Marie Robert, da audácia de ter paciência, de perseverar, de não desanimar, de ousar prosseguir com a decisão a longo prazo. Não é do outro lado da falésia que tudo começa?


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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