A terminar o seu mandato como Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral foi a escolha de Luís Montenegro para a pasta das polícias, classe profissional que, enquanto provedora, a constitucionalista de quase 68 anos elogiou.
Em seu entender, os episódios de violência cometidos por elementos das forças de segurança portuguesas são “casos excepcionais”, não existindo por regra “práticas sistemáticas reiteradas” de violência discriminatória. Era desta forma que a Provedora de Justiça Maria Lúcia Amaral se referia, em 2021, a este fenómeno.
Mais recentemente, em Dezembro passado, a constitucionalista havia de reiterar, numa entrevista ao PÚBLICO/Renascença, a mesma ideia. Questionada sobre a forma como a polícia portuguesa trata as minorias, respondeu: “Muitas vezes é o contrário do que dizem relatórios internacionais sobre o Estado português, nomeadamente o CPT – Comité da Prevenção da Tortura do Conselho da Europa. Esses relatórios dizem que nós temos um problema sistémico nas forças de segurança relativo a maus tratos. A verdade é que a provedoria não vê isso. A provedoria não corrobora isso nas suas visitas e nos seus relatórios, de modo algum”.
A terminar o seu mandato como Provedora de Justiça, cargo em que cumpriu dois mandatos e que por inerência lhe deu assento no Conselho de Estado e ao qual terá agora de renunciar, Lúcia Amaral nasceu em Angola há quase 68 anos. Eleita pela Assembleia da República para o Tribunal Constitucional em 2007, tornou-se cinco anos mais tarde vice-presidente do Palácio Ratton. Esteve entre os conselheiros que queriam viabilizar os cortes de salários e pensões decretados pelo Governo de Passos Coelho em 2014, mas cuja posição foi derrotada pela maioria dos colegas, que decretaram serem inconstitucionais. “Em determinados momentos senti que o Tribunal Constitucional interferia na política”, havia de justificar mais tarde.
Reagindo à escolha do seu nome para o Governo, o presidente do Sindicato Nacional da Polícia, Armando Ferreira, espera que quando assumir funções Lúcia Amaral “resolva urgentemente a valorização e dignificação salarial e profissional dos polícias”, pois” o futuro da segurança interna está dependente disso”. O presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia, Paulo Santos, também prefere não se alongar em considerações: “Espero que dê seguimento aos compromissos salariais assumidos pela sua antecessora”.
Nalgumas questões controversas, a professora que dedicou a sua vida académica ao Direito Público parece estar alinhada com as posições dos sociais-democratas – que, aliás, foram quem a indicou quer para o Constitucional quer para o cargo de provedora, por acordo com os socialistas, em 2017. Assim, em 2024 suscitou a inconstitucionalidade da lei da eutanásia junto do tribunal de que já foi vice-presidente, à semelhança do que havia feito meses antes grande parte da bancada parlamentar do PSD.
E no passado criticou a figura da manifestação de interesse, criada pelo Governo de António Costa, num momento em que os serviços do Estado não estavam preparados para lidar com uma avalanche de pedidos: “Essa decisão implicava asfixia nos processos no momento da extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Não podemos permitir que haja sobre as nossas telhas, sobre o nosso chão pessoas que estejam no limbo total. Porque as pessoas não têm respostas para os seus pedidos. Criámos uma situação aflitiva”, disse, em entrevista à Antena 1.
Quanto às mortes alegadamente provocadas por atrasos no atendimento por parte do Instituto Nacional de Emergência Médica — um inquérito que ainda está a decorrer quer por parte da IGAS, que pelo Ministério Público — defendeu que o Estado deve indemnizar as famílias das vítimas caso fique provado que os óbitos ocorreram mesmo por causa da greve de Novembro.
“É uma boa escolha”, considera o ex-presidente do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo Bacelar Gouveia, recordando a experiência adquirida por Lúcia Amaral enquanto provedora: “Recebeu queixas dos polícias por causa da degradação do seu estatuto profissional e também de alegadas vítimas de violência policial. Além disso, conhece muitíssimo bem o funcionamento do Estado”.
“É uma escolha melhor que a anterior [Margarida Blasco], tanto quanto é possível fazer a comparação, pelo conhecimento teórico e prático da provedora”, conclui este constitucionalista.
Foi graças a um pedido nesse sentido de Lúcia Amaral que o Tribunal Constitucional chumbou, em 2022, a lei dos metadados que permitia a conservação dos dados de tráfego e localização das telecomunicações pelo período de um ano, visando a sua eventual utilização na investigação criminal. A decisão suscitou violentas críticas por parte do órgãos de polícia criminal, em particular da Polícia Judiciária.
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