A ministra do Trabalho vê abusos no direito à amamentação e é por isso que quer impedir que haja redução de horário de trabalho da mãe para dar leite aos filhos que já tenham passado os dois anos de idade. Numa entrevista ao Jornal de Notícias publicada este domingo, 3 de Agosto, Rosário da Palma Ramalho não adianta números de situações irregulares, mas defende que é preciso definir uma “baliza” para travar os abusos que diz existirem – e que os dois anos é uma idade “lógica” para isso.
“Acho difícil de conceber que, depois dos dois anos, uma criança tenha que ser alimentada ao peito durante o horário de trabalho”, declarou a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, sugerindo que há mães que utilizam tal subterfúgio para trabalharem menos duas horas por dia, mas com remuneração paga pelo empregador.
“Temos conhecimento de muitas práticas em que, de facto, as crianças parece que continuam a ser amamentadas para dar à trabalhadora um horário reduzido, que é duas horas por dia que o empregador paga, até andarem na escola primária”, continuou ainda a ministra, mais uma vez sem dar números de situações ou de queixas sobre o assunto.
“Nada impede” que as crianças sejam amamentadas de manhã ou à noite, mas durante o horário de trabalho, a governante não vê sentido, porque a criança “deve comer sopa, deve comer outras coisas” que não exigem a alimentação materna.
Luto gestacional cai por “utilização abusiva” do lado dos patrões
A diminuição do direito ao horário reduzido para amamentação é uma das cerca de 100 alterações ao Código do Trabalho que o Governo quer promover (que garante não ser uma “contra-reforma”) e que apresentou aos parceiros sociais na semana passada. Um dos assuntos que levantaram logo imediata polémica foi a revogação das faltas por luto gestacional e, mais uma vez, por “utilização abusiva”, neste caso por lado do empregador, mas sem que a ministra quantifique o número de situações que motivaram a alteração legislativa proposta (“julgo que serão casos raros”).
“Nós tínhamos notícias de que havia alguma utilização abusiva dessa norma”, afirmou ao JN a ministra, defendendo a medida que já foi criticada pelos partidos da oposição, incluindo o Chega.
O Governo tem dito que as grávidas estão protegidas pela licença de interrupção da gravidez, voluntária e involuntária (que pode ir aos 20 dias), e que os três dias de luto gestacional previstos criavam confusão, com os referidos casos de patrões a mandar as trabalhadoras voltarem após esse período.
“Todas as grávidas que perdem o seu bebé, seja por interrupção voluntária ou involuntária, têm licença de gravidez”, clarifica a ministra, dizendo que é paga a 100% para quem contribuiu. Quem não tem seis meses de descontos, está sob um “subsídio social de interrupção de gravidez”.
Criadas pelo Governo de António Costa, as faltas por luto gestacional pagas a 100% a pais e mães visavam proteger os casos em que os médicos não reconheciam impacto físico na mãe (e, portanto, poderiam ver-se sem direito à mais prolongada licença de gravidez). Só que o actual Governo considera que isso cria confusão e, daí, anula estas faltas, garantindo que todas as mães têm direito à licença de gravidez.
E os pais? Deixam de ter os referidos três dias de luto gestacional, pagos na totalidade, mas o Governo refere que têm direito a faltar para acompanhamento à família (até 15 dias). Porém, como o acompanhamento é à progenitora e não ao filho, é com perda de remuneração.
“Preconceito contra a flexibilização”
Neste novo pacote legislativo, Rosário da Palma Ramalho também impôs que um trabalhador só deixa de ser independente quando mais de 80% do seu rendimento vier do mesmo empregador, quando até aqui essa proporção encontra-se nos 50%.
“Nós não temos que presumir que todas as pessoas querem ter um contrato de trabalho sem termo, como se costuma dizer, para serem melhor protegidas. Nós temos que acalentar e proteger todas as formas de trabalho”, argumentou a governante, que transitou do primeiro para o segundo Governo de Luís Montenegro, sublinhando que em países como Espanha é a percentagem de 80% que é contabilizada. “O preconceito contra a flexibilização em Portugal é aquilo que tem conduzido a salários baixos”, argumenta.
“A nossa preocupação é flexibilizar – e não tenho medo desta palavra – regimes que sejam necessários para aumentar a competitividade da economia, a produtividade das empresas e garantir direitos dos trabalhadores”, sintetizou.
Quanto às licenças de parentalidade, o anteprojecto do Governo propõe clarificações nos prazos – por exemplo, obriga ao gozo do subsídio inicial do pai a 14 dias (e não sete) logo após o nascimento, empurrando os restantes 14 para todo o período da licença inicial da mãe (e não num prazo de 42 dias, como actualmente) – e nas remunerações das licenças de paternidade, nomeadamente no que diz respeito às de 180 dias. “Ainda ninguém chamou a atenção para o aumento da licença de parentalidade em dois meses, nesta proposta. Só o valor dessa proposta são mais de 200 milhões de euros”, declarou ao JN.
Teletrabalho flexibilizado
Também na entrevista, Rosário da Palma Ramalho justificou a eliminação do prazo experimental dos contratos de novos trabalhadores e desempregados de longa duração (era de 120, e passa a 90 dias, como os restantes). Segundo a ministra, os empregadores deixaram de contratar a prazo, e passaram para o período experimental e, “ao fim de cinco meses e vinte e nove dias acabou o contrato que, durante o período experimental, pode ser feito cessar sem motivo algum e sem compensação alguma no final, ao contrário do contrato a termo”. O período experimental para estes casos passa para 90 dias, os contratos a prazo duplicam para um ano, num máximo de três anos (e não de dois, como agora), mas a ministra defende que o trabalhador novo quer estabilidade, mas não um emprego para a vida e que muitos vão para o estrangeiro e não é em busca de contrato sem termo.
Nas mudanças em relação ao regime do teletrabalho, alterado aquando da pandemia de covid-19, a ministra assume que o objectivo é que o teletrabalho híbrido seja mais próximo da realidade: “A forma de teletrabalho que as empresas mais usam, que é o teletrabalho híbrido, era muitíssimo difícil de aplicar este regime no Código porque estava pensado para um teletrabalho em reclusão, mas como se fosse presencial. O que não cola com a realidade”.
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