Vivo Novidades

Blog Post

Vivo Novidades > Notícias gerais > O doente de plástico | Opinião

O doente de plástico | Opinião

A sala está pronta para iniciar mais um treino dedicado a alunos de medicina. Na mesa de operações encontra-se já deitado um sofisticado manequim onde vão decorrer os gestos técnicos a treinar. Outros equipamentos de apoio simulam um ambiente hospitalar. Os alunos distribuem-se pela sala de forma a assumir as diversas funções de uma equipa médica. O treino vai começar.

O desenvolvimento da simulação médica tem crescido na última década respondendo à necessidade de formar profissionais tecnicamente competentes. As faculdades de Medicina, bem como os centros hospitalares, têm investido progressivamente em laboratórios de competências clínicas e centros de simulação de alta-fidelidade.

Os manequins de simulação avançada proporcionam oportunidades de aprendizagem em cenários controlados, permitindo errar sem consequências reais, refletir sobre a prática e desenvolver competências técnicas e relacionais entre membros da equipa. São inegáveis as suas vantagens: a segurança durante a aprendizagem, a padronização do treino médico, a possibilidade de avaliação objetiva de competências e o desenvolvimento do trabalho em equipa. Entre as suas desvantagens contam-se o elevado custo dos equipamentos bem como as limitações existentes quanto ao realismo das simulações.

Mas a simulação médica em doentes de plástico tem associado um enorme perigo! O uso exclusivo deste tipo de procedimentos pode levar à queda na armadilha da sedução tecnológica, ou seja, à utilização da tecnologia como um fim e não como um meio. É fundamental ter presente que para além dos gestos técnicos existe uma outra metade da medicina –​ a arte de saber fazer medicina e não a da técnica de fazer o saber da medicina – tão bem caracterizada por Rui Mota Cardoso. Uma pessoa não pode ser considerada como um simples manequim de plástico. E um médico não é um mecânico de corpos avariados. O médico trata pessoas doentes. Cada pessoa é um ser único, com a sua individualidade biológica, psicológica, sociológica e espiritual. Cada pessoa tem uma história pessoal que também é única. Ser médico é tratar com competência técnica, mas respeitando sempre a individualidade e a dignidade de cada pessoa doente. O foco da formação médica não pode deixar de estar nos valores essenciais da medicina centrada no doente.

Uma outra metodologia usada na formação de alunos de Medicina é a simulação médica com atores humanos (doentes simulados). Esta abordagem utiliza atores treinados para replicar cenários clínicos com elevado grau de fidelidade, permitindo que estudantes pratiquem competências essenciais num ambiente controlado e seguro. Ao contrário dos manequins, os atores proporcionam interações humanas autênticas, importantes para o desenvolvimento de competências de comunicação e empatia.

Mas é necessário ir mais além na formação dos estudantes. Uma pessoa doente não é substituível por um manequim de plástico ou por um ator. É um universo complexo e o médico deve ser capaz de abordá-lo com sensibilidade e atenção. A empatia e a compaixão são qualidades essenciais num médico, permitindo construir relações de confiança, de compreensão, e de ajuda, fundamentais para um tratamento eficaz. É por isso essencial que durante a sua formação os estudantes tenham contacto com doentes reais.

É urgente reprogramar as mentes dos estudantes de Medicina para que estejam orientadas para o ser humano e não apenas para a doença. A formação médica deverá incorporar elementos de humanização através da inclusão de disciplinas de humanidades médicas nos curricula académicos. Deverá ser promovido o desenvolvimento de competências comunicacionais e relacionais, o treino em empatia e compaixão, a valorização das dimensões psicossociais da doença, bem como a reflexão ética e deontológica. Para formar Bons Médicos a Escola tem que conseguir formar Boas Pessoas.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

#doente #plástico #Opinião

Leave a comment

Your email address will not be published. Required fields are marked *