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Solidariedade internacional: será que ajudamos ou apenas ajudamos mais ou menos? | Opinião

Aconteceu, no início do mês de julho, a 4.ª Conferência das Nações Unidas sobre o Financiamento do Desenvolvimento. Coincidentemente, nesses dias, a USAID, a maior agência de ajuda internacional, foi encerrada completamente pela atual Administração norte americana.

Vivemos, pois, um tempo incerto e imprevisível: reforço de despesas de defesa militar a subir para os 5% do PIB, enquanto o compromisso de 0,7% do RNB (uma unidade de medida ainda menor que o PIB) não é cumprido por quase nenhuns países. A obsessão pelo controlo das pessoas que migram perpassa a discriminação; a eliminação da pobreza extrema deixou de ser prioridade; a falta de condições dignas de vida, incluindo o acesso a alimentação, saúde e habitação, deixou de escandalizar; a urgência energética e económica e medidas eficazes para mitigar as alterações climáticas a todas as pessoas parecem esquecidas.

Não atrai falar de soluções, de justiça social, de solidariedade ou de coerência. Mas, com desconforto, constatamos que enquanto comunidade global estamos a falhar na nossa resposta aos desafios que coletivamente enfrentamos. Mais guerra, menos paz. É o que parecemos gritar. A paz parece desaparecer do discurso e a corrida ao armamento é cada vez mais veloz.

A União Europeia nasceu como um projeto de paz e de solidariedade. Parece estar cada vez mais dominada por discursos que priorizam o controlo de fronteiras físicas e mentais.

Falar de desenvolvimento global é ir contra essa tendência, é afirmar a defesa dos Direitos Humanos, da justiça social, da sustentabilidade, de objetivos comuns e ambiciosos que permitam que todas as pessoas, em todas as geografias, possam não só aspirar a uma vida digna, como alcançá-la.

A conferência das Nações Unidas em Sevilha foi contra a corrente. Apontou caminhos e planos de ação. Deixará o mundo que ela se cumpra?

Será que as lideranças políticas mundiais deixarão que, finalmente, as políticas públicas possam corresponder às prioridades e expectativas dos cidadãos?

Talvez valha a pena fazer um exercício de escuta. Sobre os temas de desenvolvimento global, uma recente sondagem da FEC – Fundação Fé e Cooperação e do IMVF – Instituto Marquês de Valle Flôr, duas ONGD portuguesas, feita pela Pitagórica, expressa que 83% dos portugueses acreditam que o mundo precisa de mais cooperação internacional. E, no entanto, as decisões políticas, em Portugal e na Europa, continuam a avançar muitas vezes na direção oposta: mais orçamentos militares, menos financiamento para o desenvolvimento (que, como nos mostra a história, previne as guerras); mais barreiras às migrações, menos ações para prevenir as causas que forçam tantas pessoas a fugir dos seus países. Parece haver uma desconexão entre o que as pessoas sentem e o que os governos escolhem.

A maioria dos portugueses (65%) reconhece que apoiar o desenvolvimento dos países mais vulneráveis contribui para reduzir a imigração forçada. Uma relação que parece evidente, mas essa racionalidade raramente emerge no debate político.

Em vez disso, normalizou-se considerar as migrações como uma ameaça, em vez de as reconhecer como uma consequência das desigualdades globais.

Existe também um amplo consenso quanto a questões ambientais: 73% dos inquiridos defendem o fim de apoios a projetos que prejudicam o ambiente, mesmo fora de Portugal – e, ainda assim, persistem os investimentos contraditórios que degradam ecossistemas e comunidades no Sul global, em nome de interesses económicos no Norte.

Há ainda um forte apoio a leis que obriguem as empresas a respeitar os direitos humanos e ambientais ao longo das cadeias de produção, com 86% dos portugueses a manifestarem-se neste sentido. Mas essa legislação tarda e, enquanto tarda, multiplicam-se os produtos de preço reduzido que custam caro a outras vidas.

E se cada decisão fosse pensada para o bem de todos? Que vislumbre do futuro teríamos?

Poucos meses passados do início de uma nova legislatura em Portugal, perguntamos: há vontade de reconhecer as contradições e corrigi-las? Há determinação para afirmar que a política externa não pode ser desenhada à margem da política ambiental, comercial, agrícola ou migratória? Que a coerência das políticas para o desenvolvimento é, na verdade, o alicerce do compromisso político e ético que o mundo exige?

A empatia não pode ser só um valor individual, tem de ser também um princípio de governação e diplomacia. Porque ajudar não é fazer mais ou menos. É fazer melhor. A coerência não é um detalhe – é o eixo estrutural do desenvolvimento global.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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