Por Miguel Madeira (*)
Durante décadas, o processo de obtenção de crédito habitação manteve-se refém de burocracias, prazos prolongados e uma experiência fragmentada, marcada por múltiplos intervenientes e pela baixa visibilidade por parte do consumidor. Hoje, porém, o setor financeiro está a viver uma disrupção silenciosa, mas muito estrutural, movida por um imperativo claro: adaptar-se às novas exigências dos clientes que são, cada vez mais, imediatistas, digitais e têm uma expectativa crescente no que toca à simplicidade e à transparência.
Os bancos e as entidades financeiras enfrentam, simultaneamente, dois grandes desafios: por um lado, os seus sistemas e processos muitas vezes analógicos; por outro, a pressão de um novo paradigma de consumo digital, onde a experiência do utilizador é tão relevante quanto o produto financeiro em si.
Neste contexto, a inteligência artificial generativa (GenAI) e a automação inteligente emergem como ferramentas estratégicas. A sua aplicação permite acelerar significativamente o ciclo de vida do crédito habitação, desde a simulação até à escritura, ao automatizar tarefas repetitivas, ao analisar grandes volumes de dados não estruturados e ao fornecer respostas instantâneas, através de interfaces como chatbots ou assistentes virtuais.
Um exemplo notável deste avanço é a plataforma tecnológica 4Sight desenvolvida pela Finsolutia, adotada por várias instituições em mercados europeus. Esta solução digital end-to-end tem demonstrado resultados concretos: uma redução de 40% no tempo médio de aprovação do crédito, a integração de inteligência artificial em cerca de 30% dos processos, e mais de 8000 utilizadores ativos em apenas quatro geografias. Ao conjugar a automação de workflows, rastreabilidade da informação e conformidade regulatória, esta solução tecnológica reduz drasticamente os custos operacionais, melhora a experiência do cliente e mitiga eventuais riscos de compliance.
A automação inteligente da 4Sight transforma a rotina das equipas de crédito, através de use cases que eliminam horas de trabalho manual e aceleram cada etapa do processo: desde o primeiro contacto, assistentes virtuais e chatbots alimentados por IA orientam tanto os clientes como os analistas – seja para esclarecer dúvidas sobre produtos, ajudar na abertura de simuladores de crédito ou apoiar no preenchimento de formulários – reduzindo significativamente o volume de chamadas e tickets de suporte.
No âmbito da análise documental, a plataforma substitui ferramentas OCR (reconhecimento ótico de caracteres) tradicionais com módulos de leitura e de validação automática que extraem dados de contratos, comprovativos de rendimento e due-diligence em segundos, integrando-os diretamente nos workflows de originação e compliance, sem a intervenção humana.
Para acelerar ainda mais a tomada de decisão, a plataforma 4Sight incorpora resumos automáticos de conteúdos como, por exemplo, propostas de crédito, relatórios jurídicos e informação do cliente que são condensados numa página única, permitindo aos gestores aos grupos de análise de risco que captem, no imediato, os pontos críticos sem procurar manualmente dezenas de documentos.
E quando o contacto é feito via telefone, as assistentes de chamada fazem a transcrição automática, a análise de sentimento e o encaminhamento inteligente de follow-ups, criando relatórios padronizados e garantindo consistência em cada interação.
Com estes use cases integrados, os bancos que adotaram 4Sight testemunharam reduções de até 40% nos prazos de aprovação e cortes substanciais em custos operacionais, enquanto elevam a qualidade do serviço e mantêm total rastreabilidade para auditorias e compliance.
Mas, para lá da eficiência, há uma transformação mais profunda em curso: a centralidade do utilizador. As plataformas modernas permitem-lhe participar, ativamente, na sua própria jornada – desde a simulação de cenários no portal digital, ao acompanhamento em tempo real do estado do processo, com total transparência. A inteligência artificial não processa apenas dados, como antecipa necessidades, aprende com o comportamento dos utilizadores e fornece recomendações que tornam a tomada de decisão mais segura e personalizada.
Esta mudança estrutural está a definir uma nova norma para o setor. De uma realidade marcada por processos fragmentados, elevada carga documental e baixa interoperabilidade, caminhamos hoje para um ecossistema fluído, interligado, onde a tecnologia funciona como elo integrador entre cliente, banco, regulador e avaliador.
Claro que a tecnologia, por si só, não resolve todos os obstáculos. Sabemos que persistem desafios em matéria de literacia digital, segurança de dados e alinhamento regulatório. Mas, ainda assim, o caminho é irreversível e as soluções baseadas em inteligência artificial e automação inteligente estão a transformar o crédito habitação num serviço mais ágil, justo e centrado nas pessoas.
Talvez não o vejamos com clareza ainda, mas a verdadeira revolução no setor financeiro não está nas campanhas nem nos produtos: está no código invisível que reconfigura, em silêncio, a experiência do cliente.
(*) Chief Technology Officer – Finsolutia
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