Casos de Polícia
O Hospital de São Marcos, em Braga, já não existe. Está agora integrado na Unidade Local de Saúde, depois de ter sido desmantelado. Mas foi ali que nasceu Paulo César, há quase 20 anos, após um trabalho de parto que a mãe nunca mais esqueceu.
Paula deu entrada no hospital às cinco da tarde. Tinha sofrido uma rutura da bolsa, mas ainda sem contrações. Foi-lhe administrada medicação para induzir o parto e ligada a um monitor cardíaco. Segundo a mãe, passou a noite inteira sem qualquer acompanhamento. Só às oito da manhã seguinte apareceu uma parteira.
O relatório do hospital indica que houve uma cesariana de emergência por bradicardia – o feto estava com os batimentos cardíacos perigosamente baixos. Paulo César nasceu com um índice de Apgar de 5, um sinal de asfixia.
Ficou internado 15 dias. Depois da alta, a mãe pediu à pediatra que assistira ao parto para continuar a acompanhar o bebé nas consultas seguintes. Durante meses, não falharam uma consulta.
O diagnóstico: paralisia cerebral grave
Perante as queixas, a resposta era sempre a mesma: fisioterapia para fortalecer os músculos. Só aos seis meses, quando foi enviada para um centro especializado, Paula soube o diagnóstico: paralisia cerebral grave. Paulo César também sofre de epilepsia. Não fala, não anda e usa fraldas.
A vida da família mudou radicalmente. Paula deixou de trabalhar. Anos depois teve um segundo filho, saudável. Mas o casamento não resistiu. Divorciada, Paula teve de recomeçar. Passou a levantar-se às quatro da manhã para organizar o dia dos filhos. Levava o mais velho para casa dos avós, onde ficava até à chegada da carrinha da escola. O mais novo ficava também com os avós para não acordar tão cedo.
Trabalhava numa fábrica de estofos. Quando regressava a casa, havia ainda as tarefas do costume: preparar lancheiras, roupas, refeições.
2010: Paula avança com queixa
Sempre acreditou que tudo começou naquele parto. E por isso, em 2010, avançou com uma queixa contra o hospital, a parteira e a pediatra.
Logo no início, foi pedida uma perícia médica. Os registos cardíacos do parto foram enviados para Coimbra, mas o especialista considerou-os ilegíveis. Durante dez anos, o processo esteve parado.
Só em 2020, após uma reportagem da SIC, houve avanços. O perito foi finalmente chamado ao tribunal, para analisar os registos no local. Um ano depois, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga confirmou a negligência médica.
A Administração Regional de Saúde recorreu, mas o Supremo manteve a condenação: os problemas de Paulo César resultaram da falta de assistência no parto.
A indemnização ultrapassa o 1 milhão e 800 mil euros. A Administração Regional de Saúde do Norte foi condenada a pagar por danos patrimoniais e não patrimoniais, mais juros e custas judiciais.
Contactado pela SIC, o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais diz que processos assim costumam demorar três anos. Este durou doze.
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