Vamos assistindo incrédulos ao cortejo da obstinação de Luís Montenegro em permanecer silencioso sobre as suas avenças diretas ou indiretas de entidades privadas. O seu Governo está disponível para lhe dar cobertura em não reconhecer que, como primeiro-ministro, não podia auferir essas avenças, uma delas, pelo menos, com interesses dependentes do Estado. Ponto final parágrafo.
Como Montenegro não quer dar explicações acerca desta conduta e como sabe que ficou e ficará marcado para todo o sempre por a não esclarecer, foge e leva consigo debaixo do braço o partido e o Governo para dar ares de ter apoio – revelando medo – como se uma conduta ilícita pudesse ser branqueada por uma votação eleitoral. Como advogado, bem sabe que não. Quem determina se há um ilícito são os tribunais. Quem escolhe os governantes são os povos.
Há, no entanto, nesta crise algo de misterioso e que leva a fazer a pergunta: porque foge com tanto pavor da comissão de inquérito? O que teme? O que se sabe, maculando o seu cargo, não seria caso para a crise que provocou, então de que foge ele e os que o apoiam?
Friamente: há um ano o PS teve 78 deputados, o PSD e o CDS 78. A aliança da direita ganhou por uma diferença de uns pingos. O PS deixou passar o Governo, alinhou na eleição do presidente da Assembleia da República e votou contra a moção de censura do PCP, salvando o Governo de cair. E o dr. Montenegro exige ao PS que vote favoravelmente a moção de confiança no Governo, sendo o partido da oposição por ter tido uns pingos de votos a menos? O dr. Luís não parou no tempo para ressuscitar a União Nacional de Salazar? Falta apenas arregimentar autocarros e populares e encher o Terreiro do Paço para o aclamar como salvador da pátria e da proteção de dados…
Só adiantados mentais seriam capazes de congeminar que para governarem exigiriam que a oposição desse a sua confiança política a um Governo cujo chefe está envolvido em condutas censuráveis, pelo menos do ponto de vista político. Um governo governa. Ninguém o derrubou, Não sendo sequer previsível que viesse a ser derrubado, porque se autoderruba avançando com o pedido de confiança que nunca poderia ter, pois é absolutamente minoritário?
Montenegro anda a brincar aos governos. As pirraças já o impediram de informar o Presidente da República o que pretendia com a comunicação ao país. Este por sua vez não lhe atendeu o telefone para que um birrento não ficasse só.
Perdido na preocupação da proteção de dados, Montenegro perdeu o rumo governativo, não atina com um dos primordiais princípios da chamada democracia liberal ocidental – o Governo governa, a oposição que não é governo é alternativa/alternância e espera a sua vez. O que faz o Governo pedir à oposição a confiança para continuar a governar? Quer autoderrubar-se para alegar que não o deixaram governar, quando ninguém o impediu…O Governo quer que a oposição seja sustento da sua política.
Luís Montenegro navega nos ventos da chantagem política. Sabe que a moção de confiança é o biombo para esconder as eleições que quis provocar e não tem coragem de assumir.
Sabemos que a confiança nas instituições é pouca. Que a esperança em mudar a vida não é grande. Mas um trapaceiro é um trapaceiro. E dar o poder a um trapaceiro é ser corresponsável pela trapaça.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico
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